Fonte: http://gloriadaidademedia.blogspot.com/

A confraria, que era de origem religiosa e existia mais ou menos por toda parte, era um centro de ajuda mútua.
Figuravam em primeiro plano as pensões concedidas aos mestres idosos ou já enfermos e os socorros aos doentes, durante todo o tempo da doença e da convalescença.
Era um sistema de seguros em que cada caso podia ser conhecido e examinado em particular, o que permitia dar o remédio apropriado a cada situação e ainda evitar os abusos.
Se o filho de um mestre é pobre e quer aprender, os homens de bem devem lhe ensinar por 5 soldos (taxa corporativa) e por suas esmolas — diz o estatuto dos fabricantes de escudos.
A corporação ajudava ainda no caso de seus membros precisarem viajar ou por ocasião do desemprego.
Thomas Deloney conta-nos este episódio interessante: Tom Dsum, sapateiro inglês em viagem, encontra-se com um jovem senhor arruinado, e se dispõe a acompanhá-lo a Londres:
— Sou eu quem paga. Na próxima cidade nos divertiremos bastante.— Como?! Pensava que você não tivesse mais que um soldo no bolso.
— Se você fosse sapateiro como eu, poderia viajar de um lado a outro da Inglaterra apenas com um penny no bolso. Em cada cidade acharia boa comida, boa cama e boa bebida, sem mesmo gastar seu penny. Isto porque nenhum sapateiro deixará faltar alguma coisa a um dos seus. Pelo nosso regulamento, se algum companheiro chegar a uma cidade sem dinheiro e sem pão, basta ele se dar a conhecer, não precisando se ocupar com outra coisa. Os outros companheiros da cidade não somente o receberão bem, mas lhe fornecerão gratuitamente víveres e acomodações. Se quiser trabalhar, sua corporação se encarregará de lhe arranjar um patrão, e ele não terá que procurá-lo”.
Esta curta passagem não necessita comentários.
Assim compreendidas, as corporações eram um centro muito vivo de ajuda mútua, honrando seu lema: “Todos por um, um por todos”.
Elas se glorificavam por suas obras de caridade. Os joalheiros obtiveram assim permissão para vender nas festas dos apóstolos, no domingo e nos feriados em geral.
Tudo o que o joalheiro ganhasse então era colocado na caixa da confraria, e do dinheiro desta caixa dava-se todo ano, no dia da Páscoa, um jantar aos pobres do Hospital de Paris.

Tudo se passa numa atmosfera de concórdia e de alegria, da qual o trabalho moderno não pode dar uma idéia.
As corporações e confrarias tinham cada uma suas tradições, suas festas, seus ritos piedosos e cômicos, canções e insígnias.
Ainda segundo Thomas Deloney, para ser adotado como filho do “nobre ofício” um sapateiro deve saber “cantar, soar o corno, tocar flauta, martelar, combater com a espada e cantar seus instrumentos de trabalho em versos”.
Nas festas da cidade e nos cortejos solenes, as corporações expunham seus estandartes e ocupavam lugares de destaque. São pequenos mundos extraordinariamente vivos e ativos, que dão à cidade seu impulso e sua fisionomia original.
Em resumo, não se poderia melhor caracterizar a vida urbana na Idade Média do que citando o grande historiador das cidades medievais, Henri Pirenne:
Falcoeiros
“A economia urbana é digna da arquitetura gótica, da qual é contemporânea. Ela criou uma legislação social inteira, mais completa que a de qualquer outra época, inclusive a nossa.
“Suprimindo os intermediários entre vendedor e comprador, ela assegurou aos burgueses o benefício da vida barata.
“Impiedosamente perseguiu a fraude, protegeu o trabalhador contra a concorrência e a exploração, regulamentou seu trabalho e seu salário, velou por sua higiene, providenciou a aprendizagem, impediu o trabalho da mulher e da criança, ao mesmo tempo que conseguiu reservar para a cidade o monopólio de prover com produtos os campos circunvizinhos e encontrar ao longe escoadouros para o seu comércio”.
(Régine Pernoud, “Lumière du Moyen Âge”, Bernard Grasset Éditeur, Paris, 1944)